segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Cara Estranho

- Então é verdade, Nicole? - perguntou a garota de cabelos ruivos.
Estavam as duas sentadas num banquinho ao lado da cafeteria, Nicole e Lana. Cabelos loiros e ruivos.
- Não sei de tudo, na verdade. Sei de algumas coisas que notei; afinal, ela dorme no meu dormitório.
- Então me diz, é verdade que é com aquele garoto esquisito com quem ela tem aulas de Anatomia?
- Ele é definitivamente esquisito. Esses dias - começou Nicole - a Rennée pediu uma caneta emprestada pra ele. Você sabe quem é Rennée, é aquela garota que todos meninos dizem que é "a mais gostosa de todas".
As duas garotas reviraram os olhos e fizeram cara de nojo.
- Então - Nicole continuou -. Ela chegou se oferecendo, querendo puxar papo. E ela nunca faz isso com ninguém. Ela disse "você pode me emprestar a caneta, Greg?". E sabem o que ele fez?
- O quê? - perguntou Lana, quase caindo do banquinho de excitação.
- Nada.
Lana fez cara de assombro e olhou para os lados, confirmando se alguém poderia estar ouvindo.
- Como assim nada?
- Nada. Ele entregou a caneta e saiu andando. A deixou lá, parada.
Silêncio.
- Ele tem olhos azuis lindos! - disse Lana.
Outro momento de silêncio. Cada uma avaliava seus próprios pensamentos e opiniões em relação ao garoto.
- Mas - continuou Lana -, eu quero saber da história. Meu namorado me disse que um amigo dele disse que um professor comentou na sala dos professores que encontrou os dois se pegando numa sala vazia fora do horário de aula.
- Meu amigo me disse que a amiga dele contou que já viu os dois fazendo sexo no quarto dela.
- Eu não entendo como ela gosta dele.
- Ele está sempre sozinho... - disse Nicole - anda por aí carregando quinze livros e olhando pra todo mundo com cara de poucos amigos.
- Ele tem jeito de anipático - respondeu Lana. - Mas meu namorado diz que ele é engraçado.
- Ele nem é tão bonito.
- E vai ver nem é tão inteligente.
- Ele se acha melhor que os outros.
- Ele tem jeito de ser irritante.
- Nunca entendi o que a Lisa viu nele.
- Ela fala nele o tempo todo.
- Ele nem sequer liga pra ela.
- Aposto que ele fica com outras.
- Aposto que ele fica com qualquer uma.
- Ele é ridículo.
Gregory House aparece no campo de visão das duas garotas. Veste uma calça jeans e uma blusa vermelha. Nenhuma das duas diz nada, mas a verdade é que ele parece mais bonito do que nunca.
Lisa Cuddy o vê também. Sorri e caminha - quase - corre em sua direção. A princípio nenhum dos dois diz nada, apenas sorriem. A felicidade de Cuddy é visível a qualquer distância. A cena parece uma aquarela; o azul dos olhos dele, a camiseta vermelha, o vestido verde.
É tudo tão bonito e parece tão feliz que as duas não se contentam e se sentem obrigadas a comentar:
- Ele é ridículo.
- É, ela vai quebrar a cara.

By the time hey...

- Não posso ficar mais tempo que isso - ele disse, sentando na cama e olhando para fora da janela.
- Tem certeza? - ela perguntou, com um enorme sorriso no rosto - Talvez dez minutos?
- Na verdade não, não posso.
- O que é mais importante agora?
- Me vestir antes que sua colega de quarto entre.
- Ela não vai voltar antes das seis, sete horas, House.
Ele já estava vestido, mas ainda se sentava na cama. Lisa Cuddy apenas se enrolou nos lençóis.
- Onde estão meus tênis? - ele perguntou, se levantando.
Cuddy se sentou no meio da cama e agora foi sua vez de olhar pela janela. Talvez ela parecesse solitária demais e esse foi o motivo, mas o fato foi que House parou de procurar os tênis e se sentou de volta. Ela sorriu de novo.
- Eu te digo onde estão seus tênis se você ficar mais um pouco.
- Não haverá necessidade, eles estão debaixo da tv - e se levantou de novo.
- Quando vou te ver de novo?
- Nós temos Anatomia sexta feira.
- Sexta? Por que não amanhã? É domingo, pelo amor de deus. E não me diga qu - mas ele a interrompeu.
- Eu tenho que estudar, Cuddy. - disse ele, pegando os tênis - E você deveria estudar também; esconder as notas "C" debaixo da tv nem sempre é uma boa idéia - e lhe entregou um maço de provas antigas.
Cuddy não respondeu, apenas entrou no banheiro, trancando a porta. House colocou os tênis.
- Estou indo.
Ela não disse nada. Ele caminhou até a porta, girou a maçaneta. Abriu e fechou. Cuddy saiu do banheiro parecendo irritada, e se surpreendeu com House ainda ali, de pé.
- É a terceira vez que você cai nessa.
- Vá embora estudar logo, antes que você corra o risco de ganhar um maldito "B".
Ele colocou as mãos no bolso, se inclinando pra frente. Observava o modo como ela amarrava o cabelo, quase distraído. Enquanto ele a observava, ela amarrou o cabelo e começou a arrumar a cama, sem olhar de volta para o garoto parado na porta.
- Anda, House. Eu tenho que arrumar as coisas por aqui.
Os dois ficaram sem silêncio. House olhou para o chão quando Lisa caminhou até ele.
- Será que isso foi mesmo uma má idéia? - ela perguntou, encarando-o.
Ele abriu a boca para responder, mas a porta se abriu antes que ele o fizesse. Uma garota loira entrou e encarou por alguns segundos a cena. House olhou no relógio e suspirou.
- Tire a calcinha de cima da tv - ele disse, antes de sair.
Lisa Cuddy se virou desesperada para pegar a calcinha. Isso foi um segundo antes de perceber que caíra na mesma piada pela terceira vez. Ela não pôde deixar de se sentir incrivelmente feliz.

domingo, 2 de agosto de 2009

Folhas Secas

Wilson caminhava pela rua distraídamente. Acabara de sair do oftamologista e estava com a pupila dilatada. O sol o incomodava como nunca antes, mas ele simplesmente se recusava a usar um óculos escuro. Sempre se sentia ridículo com esse tipo de acessório, achava que parecia "cool" demais por fora e comum demais por dentro, simplesmente não combinava com ele. Apesar disso, nesse momento ele quase preferia parecer um cara estranho a andar desse jeito, com os olhos quase fechados como um daqueles velhos que tenta enchergar algo que seus olhos não o permitem mais ver.
Alguns pingos caíam sobre ele, e ele andava à procura de algum toldo; se a chuva ficasse mais forte seu cabelo ficaria enrolado e com fios rebeldes, e isso era capaz de estragar seu dia.
Achou uma marquise de um café, e parou perto da janela. Ergueu os olhos para o céu e constatou, sem dificuldade, que seria uma chuva fina e passageira. Mesmo assim não sentiu vontade de sair; passou a mão esquerda pelo cabelo e suspirou. Foi quando se virou para observar as pessoas de dentro do café.
Um casal se beijava carinhosamente perto da porta do banheiro. Um senhor lia um livro acompanhado de um suco. Um rapaz, de costas, pedia algo no balcão. Uma garota batia os dedos na mesa, distraída, enquanto olhava ao redor. Um casal acompanhado pelos filhos lia o menu. E então, o rapaz ao balcão virou de frente e Wilson o reconheceu: Gregory House.
Passou novamente a mão esquerda pelo cabelo, se arrumando e se preparando para entrar e falar com o conhecido. Deu um passo ou dois em direção à porta e parou, pois House se sentou na mesa com a garota que batia os dedos na mesa. Sentiu vontade de perguntar quem era ela, mas achou que lucraria muito mais escutando às escondidas. Entrou rapidamente, olhando para o chão para não ser reconhecido, e se sentou num dos banquinhos do balcão, de costas para House e a garota desconhecida. Pegou um menu e fingiu estar lendo, mas com os ouvidos aletas.
- E qual é o motivo disso? - perguntou a garota.
Silêncio. Wilson sentiu uma vontade súbita de se virar e ver a expressão deles.
- Ouvi um boato - House disse lentamente. A garota permaneceu esperando uma resposta digna, e então ele continuou -. Algo sobre o professor de Embriologia.
- Continue.
- Preciso mesmo? - Wilson podia distinguir facilmente o tom de aborrecimento na voz dele - Quer me convencer sinceramente de que não sabe o final da história?
- Olha, Greg, eu realmente tenho mais o que fazer. Tenho um trabalho para apresentar amanhã e meu tempo seria muito melhor gasto estudando do que perdendo tempo aqui com você.
- Você e o professor, na sala de xérox. Fontes confiáveis.
Silêncio. O casal se beijando perto do banheiro riu alto de alguma bobagem qualquer. A garota disse algo baixinho que Wilson não conseguiu ouvir, e ele teve vontade de dizer educadamente a todos que saíssem dali, por favor, porque estavam atrapalhando sua investigação. A garota falou de novo.
- Não vou tentar te convencer do contrário, sabe? Estou cansada dessa sua paranóia permanente. Você podia parar de prestar atenção no que os outros dizem e prestar mais atenção em mim, que sou sua namorada.
- Você era minha namorada. Aparentemente deixou de ser quando se enroscou com um professor qualquer numa sala.
A garota suspirou, e Wilson ouviu o barulho de uma cadeira se arrastando, seguido do barulho de um salto alto batendo no chão. A mulher disse de novo:
- Sinceramente, Greg, você vai acabar sozinho. Ninguém tem paciência para essas suas crises. Na verdade, eu realmente acho que todo mundo não passa de um passatempo pra você.
House riu, e Wilson prendeu a respiração. Não era a primeira vez que ouvia alguém dizendo isso para seu amigo. E por mais que House risse e agisse como se não se importasse com esse tipo de coisa, ele, Wilson, sempre achava que no fundo isso o incomodava. House respondeu:
- Pode ir, Lisie. Não se importe comigo. Vou simplesmente beber meu café e esperar uma garota qualquer entrar, porque eu tenho certeza que qualquer uma delas será menos mentalmente atormentada do que você.
- Certo, Gregory. Vá em frente e se apaixone pela primeira garota que aparecer. Eu só te desejo boa sorte. - e saiu.
Foi quando Lisa Cuddy entrou no recinto com o sorriso mais lindo que qualquer um ali presente já vira.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

_L_

- Quinta questão: "Quantos somitos o feto possui na quarta semana de gestação?". Bom, eu acho qu...
- Não adianta achar, Cuddy, o que interes...
- Como se você soubesse de tudo!
- Como se você tivesse estudado! Eu te vi chegando no dormitório ontem de madrugada, de mãos dadas com aquele loiro de um metro e mei...
- Ele não tem um metro e meio!
House apoiou a cabeça nas mãos e olhou para o outro lado. Lisa Cuddy respirou fundo, irritada. Os dois estavam sentados na última fileira de carteiras, fazendo aquele "maldito trabalho", como disse House, que fora uma surpresa do professor para compensar a bagunça da aula passada.
- Se eu não me engano, na quarta seman...
- De quatro a doze somitos, Cuddy.
- Era o que eu ia dizer.
- Talvez, se não tivesse passado a madrugada toda com aquel...
- Qual é o seu problema?
House começou a girar o lápis na mão. Por que diabos se sentara do lado dela, de qualquer forma? Se soubesse que haveria um trabalho em dupla teria se sentado do lado de alguém mais... hm... alguém menos... anh... bem...
- House!
- Que foi? - disse ele, ainda sem olhar para ela.
- Eu estava falando com você.
- E eu estava pensando em você.
- Pensando em mim? - Cuddy corou levemente.
- Não nesse sentido. Estava pensando mal de você. Estav...
- Olha, não interessa. Acabamos o teste, agora vai lá e entrega.
House se levantou rapidamente, ansioso por ficar longe daquela menina que o fazia falar coisas que não pretendia. Entregou o trabalho e voltou para pegar sua mochila. No caminho, Cuddy já saia com a sua própria bolsa. Seus olhares se cruzaram rapidamente, mas ambos desviaram os olhos em questão de segundos.
House pegou sua mochila e viu um "Lisa" escrito em lápis na carteira ao lado da sua.
- Você e Cuddy esqueceram de assinar, House. - disse a professora, entregando o trabalho para que House assinasse. - Assine pela Lisa.
E House não pôde evitar de ver "Lisa" em sua cabeça quando ouviu.



E, mesmo tempos depois, House não pôde evitar de sentir um arrepio ao ver aquele L em sua cabeça sempre que ouvia o mesmo nome.

House não pôde evitar sentir muitas coisas...

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Um banco na neve

Gregory House caminhava lentamente pelo campus da faculdade. Era inverno e nevava, e o vento fazia com que seus olhos lacrimejassem e sua boca ficasse seca demais. Ele, porem, não se importava com isso. Gostava do tempo frio, fazia com que o campus ficasse mais vazio.
Ele se dirigia para a sala de aula. Eram oito da manhã e ele estava atrasado. Ainda que estivesse atrasado, não se importava o suficiente para correr - já havia estudado o que a professora daria nessa aula há tempos, e ia apenas para ouvir algum comentário novo e para ganhar presença.
No meio do caminho House se cansou. "Afinal de contas", pensou ele, "essa seria a minha primeira falta nesse semestre". Parou por alguns segundos e resolveu que não iria na aula. Lucraria muito mais se pegasse um livro e estudasse a matéria da aula que vem.
Foi o que fez; achou um banquinho de madeira num local onde provavelmente ninguém passaria, sentou-se e começou a ler, compenetrado.
Tão compenetrado que nem reparou na garota que passava por ali. A garota tinha olhos bonitos, e um cabelo ondulado que se movia como o vento. A garota também procurava por um banco, e o único à vista era aquele ocupado pelo garoto de olhos azuis. Sem outra alternativa, sentou-se ao lado dele.
House não percebeu que havia alguém ao seu lado. O livro sobre tumores estava interessante, cheio de imagens chocantes, o que o agradava.
A garota se sentou e olhou para as árvores cobertas de neve.
O garoto lia o livro.
Foi quando, sem perceber e sem intenção nenhuma, os dois foram apoiar a mão no banco. E suas mãos se encontraram, uma por cima da outra.
Ambos retiraram a mão imediatamente, olhando surpresos um para o outro. A garota ficou vermelha imediatamente, e House arregalou um pouco os olhos.
Gregory estava pronto para fingir que nada aconteceu e voltar a ler seu livro quando a garota se levantou. Parecendo envergonhada demais para continuar no banco, a menina ia embora. Ela dera apenas alguns passos quando ouviu o menino dos olhos azuis perguntar, sem tirar os olhos do livro:
- Qual é o seu nome?
A garota sorriu um pouco, olhando para baixo.
- Lisa Cuddy.
O menino não respondeu. Apenas olhou rapidamente para ela com um olhar totalmente desinteressado e voltou ao seu livro, completamente mudo e parecendo mais interessado no livro do que nunca.
Lisa Cuddy voltou para seu dormitório, mas aquele azul dos olhos do garoto estranho permaneceu em sua cabeça durante todo o trajeto.